domingo, 18 de novembro de 2007

PERSONAGENS DO COTIDIANO - CARLOS EDUARDO SAMPAIO

Personagens do cotidiano - Carlos Eduardo Sampaio

O preferido dos filhos era o menorzinho. Falava com admiração da inteligência do rapaz com os números e com as letras. Sorria enquanto falava, mas enfatizava: gosto de todos eles! Mas não escondia sua enorme alegria pelo único filho que sabia ler e fazer contas. Também pudera. No meio da vida sofrível que tivera com os pais, nunca tinha tempo suficiente para estudar. Trabalhava de dia na roça junto com seus pais e irmãos. Nove ao todo. Todos assim como ele: camisas suadas e maltrapilhas. Ele vai ser diferente de mim! Ah se vai! Inteligente esse diabo! Não parava de falar das habilidades do menino com as ’contas’. A soma seu moço, dizia ele, é pra mim a mais engraçada. Qualquer erro e o resultado já era. Tentei lhe explicar que nessas abstrações matemáticas, segue-se uma lógica, e qualquer falha nessa lógica, em qualquer que fosse a operação; seja soma, multiplicação ou divisão, o resultado estaria perdido. Mas desisti. A vergonha não me deixou que naquele momento se abrisse um abismo intelectual entre eu e aquele sujeito simples e rústico. E continuei a escutá-lo. Nesse instante eu já ia do cansaço de ficar em pé a ouvi-lo à curiosidade pelo seu modo expressivo de se comunicar. De todo esse momento, a única coisa que estava em meus pensamentos, era uma terna condescendência de estar diante de uma pessoa que me era familiar somente nos livros. Quem nunca ouviu falar que o sertanejo era, antes de tudo, um 'forte'? Pois é. Naquele instante, vi um desses se emocionando e convertendo em lágrimas a sua admiração pelo filho mais novo, que sabia ler e escrever.

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